O que é Mandala Reflexiva?

Veja artigo A configuração de um diagrama heurístico socioambiental: a Mandala Reflexiva, em:
http://www.remea.furg.br/edicoes/vol19/art27v19a15.pdf , autoria de Virginia Machado

Leia também:

 A APLICAÇÃO DA MANDALA REFLEXIVA NA ORGANIZAÇÃO DA PESQUISA SOCIOAMBIENTAL EM 2010


MACHADO, V .



Linha temática: 1. Fundamentos em Educação Ambiental

Palavras chave: problematização, intervenção, avaliação de impacto.


INTRODUÇÃO. Trata de um tema relacionado à metodologia de pesquisa socioambiental através da resolução de problemas. É resultado parcial da pesquisa ‘Estudos sobre o uso de modelos conceituais em processos de identificação, problematização e resolução de problemas socioambientais’, em andamento, vinculada ao PPGEA/FURG, iniciada em 2009. Parte da investigação ocorreu durante o tópico especial “Mandala Reflexiva: modelo conceitual para estudos socioambientais”, oferecido pela autora naquele programa. O modelo conceitual em questão consiste de um diagrama heurístico para a configuração do pensamento sistêmico e da resolução de problemas socioambientais. Define-se resolução de problemas como a sincronia entre a identificação, problematização e proposição interativa de resolução com os envolvidos. O problema da pesquisa consiste “da necessidade de parâmetros para a identificação de um problema de pesquisa socioambiental”. A criação da Mandala Reflexiva (Machado, 2009) é resultado de uma construção que faz uso simultâneo de conceitos tratados na Teoria da Ação Comunicativa de Jürgen Habermas (2005); nas Teorias de Sistemas, a partir de Ludwig Von Bertalanffy (1977), na Teoria Crítica, desde Max Horkheimer (2002); na Psicologia Cognitiva a partir de Jean Piaget (2002); na Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung (2007). O termo mandala, do sânscrito, significa círculo, relacionado à filosofia oriental. Jung (2001) acreditava que o círculo simbólico representava a imagem da totalidade psíquica, o objetivo da individuação. Presume-se que Jung pode nos ajudar muito na construção de uma psicanálise da produção de conhecimento, justamente neste momento de crise paradigmática que experimentamos. O termo “reflexiva” está relacionado ao sentido atribuído a uma sociologia reflexiva (Melucci, 2005; Giddens, 1991). Conforme Machado (2009), os princípios que levaram à criação da MR seriam os mesmos indicados por ela para a resolução de problemas: a interdisciplinaridade, a ação comunicativa e os princípios de sistemas. Argumenta-se que a sincronicidade de tais princípios aos poucos dá visibilidade ao complexo e ao nexo das pretensões de verdade do pensador heurístico (o estudante/pesquisador que se dedica à resolução do problema), bem como de suas possibilidades e limites de pesquisa socioambiental. Entende-se que esta se caracteriza pela problematização e pela intervenção sincronizadas. O modelo MR se presta a possibilitar a visualização da dinâmica da resolução de problemas socioambientais através da organização dos seguintes elementos: a) Identificação do Problema: indicando-se os seus aspectos institucionais, epistemológicos e pedagógicos; b) Contexto dos sujeitos envolvidos em seus tempos e espaços; c) Problematização: as idéias prévias, os conceitos chave, as ciências e filosofias; definem-se aí os procedimentos metodológicos; e) Interação/Propostas elaboradas com a rede de relações dos envolvidos e a f) Emergência: propriedade sistêmica recorrente quando da análise de todos os elementos tecidos junto, durantes as reflexões com a aplicação do modelo, tendo como foco a problematização, a intervenção e a avaliação de impacto. A priorização da intervenção constitui-se como fundamento da pesquisa-ação. Os objetivos pretendidos com a aplicação da MR são: a) contribuir para a organização da pesquisa socioambiental; b) dar visibilidade à dinâmica da construção de conhecimento acadêmico numa abordagem sistêmica e, c) investigar sobre metodologias comunicativas de resolução de problemas e de avaliação de impacto. Quanto à atividade para a identificação de um problema de pesquisa socioambiental salienta-se que o que caracteriza um problema socioambiental é o reconhecimento pelas partes envolvidas de que tal problema é um problema. A relevância da pesquisa sobre modelos conceituais para a pesquisa socioambiental refere-se à constatação da dificuldade dos alunos e das alunas da graduação e pós-graduação na organização das próprias pesquisas e da explicitação do nexo das mesmas.

MATERIAIS E MÉTODOS. Organizou-se um Tópico Especial, de duas horas/aula, para o primeiro semestre de 2010, equivalendo a 2 créditos, integrado como componente curricular do programa citado. Trata-se do “Mandala Reflexiva: modelo conceitual para estudos socioambientais”. Matricularam-se 6 estudantes. Após o primeiro encontro, quando a MR foi apresentada com o auxílio de um pôster, sempre disponível para recorrências didáticas, foi feita a proposta de que cada participante encontraria na disciplina uma maneira de organizar as próprias pesquisas. Explicitou-se que seria abordada a concepção de Educação Ambiental como o conjunto de saberes e fazeres empenhados na resolução de problemas socioambientais locais, envolvendo epistemologia ambiental e micro ações. A partir de uma conversa com cada integrante solicitando que abordasse suas intenções de pesquisa foi diagnosticado que não poderíamos dar conta de um aprofundamento de toda a MR, mas que poderíamos trabalhas a Identificação e o Contexto do problema de pesquisa de cada um. No decorrer dos encontros cada estudante apresentaria ao grupo suas mandalas, que seriam reescritas a partir da reflexão com o grupo. As mandalas foram desenhadas a lápis em folhas de papel almaço abertas. Quando refeita, a cada reflexão, a mandala não seria desprezada. Ela poderia ser apagada somente nos encontros quando apresentada e “corrigida” com o grupo. Depois, em outro momento, com nova reflexão, seria reescrita em outra folha. Todas as folhas em seqüencia fariam parte do portfólio do pensador heurístico. Para discutir sobre Identificação e Contexto do problema de cada estudante, considerando as angústias diagnosticadas nos dois primeiros encontros, construir-se um seminário, paralelo às exposições didáticas da MR, sobre o conceito de Lugar, para aproximações de compreensões dos elementos Identificação e Contexto, percorrendo diferentes autores, a saber, Milton Santos, Octavio Ianni, Michael de Certeau, Anthony Giddens e Marc Augé. Para facilitar a comunicação entre o grupo foi criado um blog. Na medida em que comparávamos os pontos de vista dos autores, cada estudante reportava-se à tarefa de construção da própria mandala. Fizemos apresentações e comentários sobre a mandala de cada um, apontando avanços e fragilidades, dando ênfase às emergências incentivadas pelas discussões, auxiliando o apresentador da vez a rever o caminho adotado e a reconfiguração possível de sua mandala. Como avaliação parcial foi solicitada a tabulação da seqüência das mandalas para possibilitar a análise da evolução de suas construções e a consciência da configuração sistêmica que haviam criado com o uso da MR. A avaliação final, em andamento, consistirá da elaboração de um resumo expandido sobre o problema de cada um, tendo como referência a estrutura conceitual configurada com o uso da Mandala Reflexiva.

RESULTADOS E DISCUSSÕES. O processo de ensino e aprendizagem ocorrido entre nós possibilitou à autora deste e professora da turma uma orientação que necessitava, já que resolveu oferecer uma disciplina com o nome de Mandala Reflexiva, anunciando que se tratava de um modelo conceitual, portanto parâmetro, idéia de paradigma, para estudos socioambientais para mestrandos e doutorandos em plena crise paradigmática e assoberbados de avisos e discussões de tendências divergentes. Exaltados, animados e amedrontados, pois quem se aventura pelos caminhos da pesquisa acadêmica sabe disto, vieram pelas expectativas que criei e por isso assumi a responsabilidade de cumprir o anúncio da propaganda. De início, após se chegar a um consenso sobre o uso da MR e dos procedimentos e autores a serem trabalhados como pretexto para a experiência científica, ética e estética do modelo, já tomavam ciência da confusão dos rabiscos que ensaiavam fazer e do esforço a ser empenhado para o reconhecimento das possibilidades e limites de pesquisa. Estas propriedades começavam a falar deles e delas como candidatos e candidatas à progressão acadêmica, como pesquisadores e educadores ambientais. A partir daqui, no intuito de objetivar o relato dos resultados, destaca-se os mesmos por itens. 1. O apoio bibliográfico individualizado: sabendo da temática do projeto de pesquisa de cada estudante foi possível indicar referências complementares às discussões motivadas pelas leituras programadas pelo seminário. Este procedimento demonstrou a necessidade de delimitar a configuração do problema que se quer identificar, direcionando o estudante para leituras fundamentais ou para leituras específicas do estado da arte. É preciso orientar sobre a diferença entre a epistemologia ambiental e as narrativas do estado da arte. Neste caso, anota-se como prioridade reforçar as leituras sobre epistemologia ambiental em Leituras Dirigidas. 2. A solidariedade: assim como foi possível constatar a validade do uso da MR na organização do pensamento dos estudantes com relação à identificação o problema de suas pesquisas, enquanto compartilhávamos dúvidas e insights, foi possível também observar a disposição e autoconfiança dos estudantes para enfrentarem a revisão dos próprios conceitos quando têm modelos conceituais de referência. 3. Sobre a identificação do problema de pesquisa: pondera-se que o estudante de pós-graduação precisa muito de orientação para iniciar sua formação de pesquisador. Houve interesse e procura da MR para que fosse oferecida também no segundo semestre. No último encontro os estudantes relataram que já estavam ajudando colegas de outras turmas a utilizar a MR. Embora não se possa atribuir somente à MR, observou-se mais clareza na definição do problema de cada estudante, da primeira para a quarta mandala. Confirmou-se a importância das mandalas serem feitas artesanalmente, escritas a lápis em folhas abertas de papel almaço, porque há mais espaço e pode se fazer as anotações sem medo de errar e rasurar, já que serão guardadas para a tabulação final. 4. A historicização das MR como documento das configurações sistêmicas: os estudantes relataram que a coleção de mandalas foi importante para conferirem a evolução das impressões sobre o próprio problema e do quanto foram ficando mais claras, amplas e aprofundadas. Neste ponto, para aperfeiçoamento da elaboração das mandalas, alguns exercícios prévios precisaram ser criados para cada elemento da MR para que se possa oportunizar a atividade mental de recorrência do geral para o particular com o acompanhamento de todos nos encontros. Alguns estudantes são bem mais dispersivos e têm dificuldade para prestar atenção nas exposições didáticas sobre a MR. 5. A criação do LAPIS – Laboratório de Problematização e Intervenção Socioambiental: o relato do progresso dos estudantes na direção do problema desta pesquisa, todo o envolvimento com eles e a busca por materializar a concepção de Educação Ambiental na qual se vem trabalhando, tomou-se a iniciativa de criar o LAPIS. O laboratório estará vinculado ao Instituto de Educação/FURG, que abriga o PPGEA. Ali se pretende reunir pesquisadores e alunos da graduação e da pós-graduação, matriculados e egressos, membros da comunidade e outras organizações comprometidas com problematização e intervenção socioambiental locais. O LAPIS está em conformação e pretende investir esforços em pesquisa-ação de demanda de reflexão e ação, em organização e aplicação de ações, em avaliação de impacto ambiental de ações, de publicações e de elaboração de banco de dados para disponibilizar a usuários locais e da rede. 6. Criação de duas disciplinas optativas para a pós-graduação. A partir desta experiência com a MR aplicada para a organização da pesquisa socioambiental estão sendo organizadas duas disciplinas de 3 créditos, a serem oferecidas pela autora uma em cada semestre, a saber, Problematização e Intervenção Socioambiental I e II. Estas farão parte das atividades do LAPIS, juntamente com Leituras Dirigidas e Prática de Pesquisa. Abre-se um campo de atuação que prevê a organização da pesquisa socioambiental com visibilidade para os interessados e principalmente com o objetivo de avaliação de impacto ambiental das ações e reflexões buscando-se um salto qualitativo nos processos de Educação Ambiental.

REFERÊNCIAS:
AUGÉ, M. Não-lugares: introdução a uma antropologia da supermodernidade. Campinas: Papirus, 1994.
BERTALANFFY, L. V. Teoria Geral dos Sistemas. Petrópolis: Vozes, 2008.
CERTEAU, M. de. A invenção do cotidiano 1: Artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.
-----. A invenção do cotidiano 2: Morar, cozinhar. Petrópolis: Vozes, 2003.
GIDDENS, A. As conseqüências da Modernidade. São Paulo: Unesp, 1991.
HABERMAS, J. The theory of communicative action. V. I e II. Boston: Beacon Press, 2005.
HORKHEIMER, M. Eclipse da razão. São Paulo: Centauro, 2002.
IANNI, O. Teorias da globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996.
JUNG, C. G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Vozes, 2007.
MACHADO, V. M. Mandala Reflexiva para a configuração do pensamento sistêmico e da resolução de problemas socioambientais. Tese de doutorado em Educação Ambiental. Rio Grande: PPGEA/FURG, 2009.
MELUCCI, A. Por uma sociologia reflexiva: pesquisa qualitativa e cultura. Petrópolis: Vozes, 2005.
PIAJET, J. Epistemologia Genética. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
SANTOS, M. Da totalidade ao lugar. São Paulo: EdUSP, 2005.
-----. A natureza do espaço. São Paulo: EdUSP, 2006.

[Resumo expandido aceito apresentado ao IV CPEASUL Camboriú, 2010.]